Caminhando na Estrada Cultural

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Casa Poema

Foi com muita garra poética que no decorrer do ano que está terminando, a Casa Poema e sua equipe conduziram tantas pessoas em uma maravilhosa viagem pelo reino da poesia que nesta casa habita.
Nosso recital que aconteceu na ultima terça-feira 21, para fechar bem este lindo ano que passa, foi fantástico! A casa estava florida e com várias crianças a sentir desde cedo em suas vidinhas, a vibração poética que existe em cada cômodo deste Lar. Antes do inicio do recital, brincaram e se divertiram à beça na nossa biblioteca poética. Depois assistiram ao recital e curtiram, muito bem comportadas. Vale dizer que essas crianças estavam na faixa de 6/7 anos.
Então, pessoal, fica a dica: Podem trazer as crianças. Elas adoram a Casa Poema!

Muita gente não sabe das outras atividades que a Casa Poema exerce. Para estes queridos curiosos, disponibilizamos o vídeo do projeto que estamos desenvolvendo junto com a OIT (Organização Internacional do Trabalho)
“Palavra de Polícia, Outras Armas”

Para quem ama a poesia e deseja estar mais perto dela, aí vai mais uma oportunidade logo no começo do ano que se inicia:

Dia 11 de janeiro, (quarta-feira) faremos uma aula aberta para a curtição de quem quiser. É só chegar, se acomodar e curtir mesmo. As aulas são divertidas e em geral, quem vem para este processo, sai daqui com gostinho de quero mais e com novos horizontes gerais. Pare de adiar e venha logo pra cá!

Lembrando que do dia 16 ao dia 20 de janeiro (segunda à sexta) das 19:30 às 21:30 teremos Oficina de Poesia Viva!
As incrições já estão abertas!
Garanta a sua vaga através dos telefones:
(21)2286-5977 ou 9708-9885

Elisa Lucinda e a equipe da Casa Poema, desejam Boas Festas, ou seja, Festas realmente significativas que vão além do aparente consumismo da ocasião.
Aproveitemos o Novo Ano que começa para redimensionar os nossos sonhos e nossas possibilidades dentro da linha do tempo.
Elisa Lucinda nos deixa essas reflexões sobre o Deus Tempo nessas duas crônicas abaixo.

Feliz Natal e um poderoso e iluminado Ano Novo.
São os votos da Casa Poema!


Carta ao Tempo I
Mesmo com toda a sua sutileza, sua onipresença divina, sua continuidade e perseverança imperceptíveis, mesmo com seu mistério e seu poder sou Tua macaca de auditório, Deus Tempo, Tua fã. Queria um pôster Teu no meu quarto. Mas de corpo inteiro, não em partes como sempre te vejo, oh Divino. Também porque o seu inteiro é o eterno, não é? Eterno é uma palavra sem fim, sem limites, parente da palavra infinito. São da mesma família e ambas querem dizer do que são maiores que a nossa matemática pode supor. Por observá-lo tanto cada vez mais vou amando o que chamam envelhecer. A gente fica muito mais sabido e vai entendendo como é bem  bolada a cosia toda. Com o tempo, ficamos mais descolados, mas espertos, já conhecemos alguns mecanismos de nos iludir, nossos esquemas e funcionamento de erros, vícios, e outras deliciosas fraquezas. A vida é uma grande viagem, e embora não se reconheça tanto o valor do mais velho, este, pela experiência que resulta em sabedoria, vai ganhando autoridade para sentar logo na janela para ganhar outros assentos com privilégios de paisagens. Quando ouço alguém dizer que não quer pôr mais filho nesse mundo cruel, penso, que o mundo se fosse mesmo muito ruim a gente quereria sair logo dele. Mas não. O que nos ocorre, em geral, é uma vontade de ser eterno, uma loucura vampírica com desejo de ser eternamente jovem e principalmente, a obsessão de escapar da morte. O medo dela não é só porque morrer provavelmente doa como processo. O papo é que morrer acaba com a festa. Mãe cruel que tira a gente da brincadeira de viver. O fato de ser matematicamente cada vez mais perto da morte, a velhice angaria más línguas para si. É uma pena. Aos cinqüenta e três anos estou me sentindo muito bem. Potente. Estão preservados em mim a Lili, a Elisinha  e a Formiguinha Atômica, meus apelidos de infância, a Morena, a Nega, a Luccinda, meus apelidos de universidade, e Preta , Elisa Lucinda, Lucinda, Pretinha e Elisa, a mulher que me tornei. Esse coletivo de estações do Deus Tempo, trago em mim como uma herança. Como quem herdou casas, imóveis de luxo, extensas fazendas com milhares de cabeças de gado, herdei minha criança com sua espontaneidade, seu amor pelos lápis de cor, sua palhaçada, sua disposição para o novo e sua inocência; herdei minha jovem mocinha com sua irreverência, sua vontade de ajudar a melhorar o mundo, seu romantismo, sua esperança radical, sua ousadia  em se lançar na estrada da existência na transitoriedade de cada momento. Esses múltiplos personagens que vivem no quintal de meu coração, dando suporte a minha personalidade não vieram sozinhos, veio com eles o rebanho de sonhos. Alguns desses sonhos perderam validade, não resistiram ao futuro que lhes coube. É mesmo muito interessante esse tipo de riqueza que o Tempo nos oferece; a capacidade, a potência de trazer no cofre humano que também atende pelo nome de memória, tudo o que vivemos: Amores, prazeres, felicidades, gozos, plenitudes, tudo pode ficar eterno (leia-se eterno aqui como coisa que dura enquanto se vive). Quem pode tirar de mim, meu pai Tempo, as declarações de amor que recebi como mulher, como fêmea, como dama? Quem pode arrancar de mim as amorosas penetrações, os beijos nas mãos, os gestos de delicadezas, as palavras de amor que li nos olhos dos amantes e ouvi nas noites claras de luar? Hein? Me fale,  quem poderá ? Outro dia pensei em comprar a casa da minha infância lá em Itaquari, e a de Vila Velha, naquela rua linda cheias de árvores. Ainda bem, que em tempo, me lembrei que não preciso comprá-las uma vez que elas estão intactas dentro de mim com todos os seus bem quereres. Se as comprasse agora seria pior para mim; viriam sem minha mãe, minha irmã, meus avós dentro. Seria um péssimo negócio. E para os sofrimentos, que experimentamos logo ao nascer, há a chuva dos prantos, os escoar da dor, a cicatrização da ferida e depois o esquecimento. Uma beleza! Pois sem esquecer dos sofrimentos como amaríamos de novo, como teríamos coragem?
Observando-te, meu senhor, percebo sua categoria em se dispersar, se diluir em inúmeras transparências conceituais. Eu explico: da janela penso ver o tempo e pareço querer me referir à temperatura, a seu estado nublado e chuvoso, aos seus ventos, ao estado do dia e ao próprio dia. Esse, por sua vez, se divide em três partes principais: manhã, tarde e noite sendo que todos nascem da madrugada. Também é tempo o tempo que passa dentro de um dia, ou seja, as suas vinte e quatro horas, dentro das horas minutos; dentro dos minutos os segundos, e dentro dos segundos os instantes. Chegadas e esperas tudo pertence ao Tempo, tudo pertence a ti. Presente, passado, futuro, ontem, agora, hoje, daqui a pouco, até amanhã, já- já e quando, são palavras de seu dicionário. Primavera, verão, outono e inverno, semanas, meses, séculos, tudo pertence ao seu império, seu terreno, ao lote de onde és o meeiro. Veja como é a vida: por seres tão invencível, me obrigas nesse momento a continuar na próxima crônica esse pensamento. Acabou meu tempo.
                                                                                                                                                    
Carta ao Tempo II
Como uma criança pequenina, minúscula criatura amparada nos braços do mundo, estou em teu colo, meu Pai, para onde me levas? O passeio é uma aventura que se passa nos cenários do micro e do macro cotidiano. Daqui de dentro da minha alma, olho o céu de Brasília, meu amante secreto, e pergunto a ele qual o seu mistério, Deus Tempo. Nada responde. No entanto , entendo  as suas medidas, meu Pai. Por exemplo, também é tempo o passado, o que está acontecendo no presente, e o que virá no futuro. Coisa linda foi perceber tua relatividade, tua não linearidade. Que bom quando se pára de sofrer pelo tempo que não volta, como se fosse um tempo perdido só porque não volta mais. Não é bem assim. Há as compensações que fazem resultar em empate o jogo. Conheci uma mulher, Dona Hortência, que passara anos chafurdando num casamento burocrático, sem direito a gozos ou beijos na boca com fervor. Tudo do lado de fora, casas, carros, seguros, aplicações, viagens, luxo, fazia-lhe crer que aquela letargia, embora triste, pudesse atender pelo nome de felicidade. Mas a depressão era crônica acompanhada por Rivotril e Fluoxetina. Até que um dia aos sessenta, amou outro homem e foi com ele para o Caribe e nunca mais dor de cabeça, nem tristeza, nem angústia, nem desânimo. O gozo que vivia há poucos dias não deixava vestígio dos quarenta anos em que não o vivera. É quando Hortência renasce no tempo, vira menina na nova experiência. Recomeça. Depois fica viúva do amante, mas já era renascida e reconta sua vida a partir dessa nova medida. Os dois anos que passara com o seu amor ressignificaram sua existência mais do que as quatro décadas de insatisfação ao lado do marido. Assim é com tudo, e obrigada ,Tempo, por nos dar mais esta carta. Foi assim que Clementina de Jesus virou cantora aos sessenta e cinco anos e Cora Coralina publicou o primeiro livro aos setenta e cinco. E tem mais, o fato de termos um novo olhar presente sobre aquilo que vivemos no passado torna-Te quase retroativo, Pai. Não dá para voltar a trás e fazer diferente, é verdade. Mas se pode olhar para o vivido de uma nova maneira. Esta é outra carta boa sua, meu bem. Sem a qual não haveria o perdão e de nada valeria o saber novo se este não pudesse dar conta de nos esclarecer os acontecidos, ampliá-los dentro do seu território como quem estica um grande tecido. Pois a compreensão posterior nos põe em boa situação de observadores. Vejo, pela distância do tempo, os vários lados do tabuleiro de uma experiência que, enquanto eu  nela vivia, não via suas dimensões e limites por falta de visão. Com o tempo ,mudam os parâmetros. Sua passagem, Tempo, muda de posição as referências como mudam as pedras durante a idade de um rio. Eu disse aqui que fazer cinqüenta anos é como pegar o morto durante um jogo de buraco ou canastra. Quando começa o jogo de adulto, pra lá um pouco dos vinte anos, as cartas estão ainda desencontradas, reza-se em várias rodadas para ver se pelo menos vem um três para se fazer uma trinca. No cinqüentinha não: várias jogadas começadas, várias canastras podem ser limpas com as novas cartas que o morto trás. E tem mais, já não há mais aquelas preocupações primeiras de sobrevivência e escolha de carreira ,de modo que o tempo que uso hoje conta com grande parte da estrada construída. Ganhei tempo. E ao mesmo tempo como só tem três anos que fiz cinqüenta, sou ainda neném na nova fase. Ai, ai, tu és mesmo uma coisa muito bem bolada: exato, impreciso, infinito, calculável, incalculável, e por isso deita e rola no quintal do subjetivo. Estou contigo, meu Rei. Ninguém te para, ninguém se mete contigo. Gostas do jogo, do filho que negocia, daquele que quer compreender o seu círculo ininterrupto que faz de toda a madrugada grávida de um novo dia. Que faz com que todo dia morra para que nos seja garantida uma nova manhã, sempre, oh Altíssimo! Todo dia é dia de renascer, fica a lição. Há os que agradecem aos cânceres derrotados, perdas e outras mazelas, porque estas os despertaram e fizeram com que resignificassem suas vidas e passassem em  revista seus sonhos, seus hábitos de perderem o tempo sem nem notar, de não aproveitá-lo, de não mergulhar em suas piscinas de variadíssimas temperaturas e profundidades. 
Bem, como escrever é um ato de amor, quem se despede agora  é a amante, mas também são essas, palavras de uma menina diante de ti. Pai, dê um laço aqui no meu vestidinho atrás, me dê a mão, Tempo sem fim, e vamos passear?
                                                                                                   Beijos, Elisa Lucinda

Nenhum comentário: